quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Capa criada por Chris Ware e rejeitada pela revista Fortune

Chris Ware, autor de Jimmy Corrigan e da série Acme Novelty Library, foi contratado para fazer a arte da capa da revista Fortune 500, que lista as 500 maiores fortunas do Mundo. Ware zombou dos ricaços, que foram desenhados dançando no topo de um edifício enquanto o resto da população sofre horrores com a crise financeira e o descaso do governo. A arte foi rejeitada pela revista. Ware pode perder o trabalho, mas não perde a piada.

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Uma vida inteira em 72 páginas, por Chris Ware


Poucas vezes o autor de quadrinhos Chris Ware foi tão impiedoso com um personagem. Sua mais recente novela gráfica devassa a vida de Jordan Lint, desde o berço até o leito de morte. Seus sentimentos e atitudes ora tocantes, ora detestáveis, são mostrados sem condescendência. Não há heróis nem vilões nesta obra de Ware, e não há conclusões fáceis. Acme Novelty  Library 20 é um livro deliciosamente incômodo.
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Jordan Lint é um sujeito bem comum, a criança problemática que se torna o valentão da classe e na vida adulta acumula relacionamentos desastrosos. A história de sua vida se torna interessante pelo modo como é contada. O autor acerta ao equilibrar os aspectos positivos e negativos da personalidade de Lint, e deixar que o leitor julgue o personagem. Ele é o garoto que agride os colegas e o homem que trai as mulheres, mas também é a criança que perdeu a mãe e foi criada por um pai racista; pode ser cruel e egoísta, mas também é uma vítima. E embora viva muitos momentos felizes, Lint nunca deixa de ser perseguido por seus fantasmas.


A história é contada de modo fragmentado, construída com uma sucessão de narrativas curtas (geralmente de uma página) que mostram diferentes aspectos da personalidade do protagonista. Ware corta e reconstrói habilmente o fluxo do tempo: a passagem de vários anos tranqüilos é resumida em uma página de apenas seis quadrinhos, enquanto um instante mais intenso pode aparecer também em uma página, mas na forma de um mosaico de mais de trinta quadrinhos.


O traço do autor continua claro, simples e geométrico, e as cores são sempre agradáveis, mas algumas ousadias visuais aparecem em momentos estratégicos. Logo no início do livro, o nascimento e a infância de Jordan Lint são mostrados com desenhos extremamente simples, que vão ficando gradualmente mais realistas enquanto o personagem se aproxima da idade adulta. O estilo da arte muda radicalmente para um rabiscado quase infantil quando Lint lê um relato escrito por seu filho, numa passagem que também é uma homenagem declarada ao estilo visual primitivo do autor de quadrinhos underground Gary Panter. O delírio simétrico da última página encerra o livro com perfeição visual e narrativa (mas o leitor cuidadoso perceberá que Ware estende o final da história até a última capa do livro).


Acme Novelty  Library 20 (ou “Lint”, como já é chamada por alguns leitores) faz parte do arco de histórias do personagem “Rusty Brown”, assim como a também excelente Acme 19, mas se sustenta individualmente. O autor não se acomodou e optou por um estilo narrativo mais denso e direto que em Jimmy Corrigan, sua obra mais conhecida (e a única publicada no Brasil). Está entre as mais belas criações de Chris Ware, e sem dúvida foi uma das melhores novelas gráficas lançadas nos EUA em 2010.

Autor: Chris Ware
Editora: Drawn and Quarterly
Ano de Edição: 2010
72 páginas

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Arte Original de Jim Woodring

Os roteiros de Jim Woodring podem ser incompreensíveis, mas seus desenhos são sempre fantásticos! Algumas páginas originais de Congress of the Animals, a próxima HQ de Jim, foram divulgadas no blog da editora Fantagraphics.




domingo, 5 de dezembro de 2010

Monstros, fantasmas e pragas adolescentes em Big Baby, de Charles Burns


Tony Delmonto, também conhecido como Big Baby, poderia ser um típico garoto norte-americano, se não fosse por seu rosto de bebê e por estar sempre topando com monstros, pragas adolescentes e fantasmas de meninos mortos. Tony, como muitos garotos de sua idade, é extremamente imaginativo, tem um melhor amigo e adora HQs e filmes de terror e ficção científica.

A coletânea Big Baby reúne cinco HQs protagonizadas pelo personagem criado por Charles Burns e publicadas entre 1983 e 1999. Nas duas HQs mais antigas Burns ainda desenha os personagens de modo um pouco caricatural e cômico. Mas a partir de Teen Plague, a terceira história do livro, vemos a arte extraordinária e inconfundível que ficaria bem conhecida na novela gráfica Black Hole. Uma arte precisa e sombria, mesmo nas cenas diurnas. Tudo que Burns desenha parece moldado a partir da mesma matéria negra e brilhante. Se Jaime Hernandez é perfeito no equilíbrio entre branco e preto nos quadrinhos, Burns é mestre no domínio opressivo das sombras negras sobre o branco.


Teen Plague parece um ensaio para Black Hole. Também trata de uma doença transmitida entre adolescentes, causando alterações físicas e alucinações. A imaginação de Tony Delmonto nunca para de trabalhar: o garoto acredita que uma praga está se espalhando quando vê um chupão no pescoço de uma garota. Por coincidência, Tony está lendo uma HQ em que invasores do espaço contaminam os humanos, deixando uma marca semelhante. A ironia é que realmente existe uma praga se espalhando, embora nada tenha a ver com ETs ou chupões. Burns consegue equilibrar horror e humor de modo refinado, e ainda homenageia os quadrinhos violentos publicados pela EC Comics nos anos 1950.


O clima de horror se insinua desde o início das narrativas, mas o autor sabe a hora exata de surpreender o leitor. A violência é usada de modo ponderado, ao contrário da maioria das HQs e filmes do gênero.

Graças a obras como Skin Deep, Big Baby e Black Hole, Charles Burns já pode ser considerado um dos principais autores de quadrinhos de horror de todos os tempos.

Autor: Charles Burns
Editora: Fantagraphics Books
Ano de edição: 2007
96 páginas


quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Neil Gaiman seleciona as melhores HQs americanas recentes


Neste quinto volume da coletânea anual The Best American Comics estão reunidas algumas das melhores HQs publicadas nos EUA – por autores norte-americanos ou residentes nos EUA – entre Setembro de 2008 e Agosto de 2009. O editor responsável pela seleção final das histórias da antologia muda todo ano. Em edições passadas, o posto foi ocupado por personalidades do mundo dos quadrinhos alternativos como Harvey Pekar, Chris Ware e Charles Burns. O escolhido para a edição deste ano foi Neil Gaiman (autor de Sandman), muito mais mainstream que seus predecessores, o que gerou certo temor de que obras alternativas ficassem de fora.

A seleção de Gaiman realmente não surpreende pela ousadia, privilegiando narrativas mais longas e tradicionais, mas abrange grande variedade de estilos, e o resultado até que é bem interessante.

Entre as melhores HQs selecionadas, três alcançaram um grande público e já foram publicadas no Brasil: Genesis de Robert Crumb, Asterios Polyp de David Mazzucchelli e Scott Pilgrim vs. The Universe de Bryan Lee O´Malley. Nenhuma dessas poderia ficar de fora, mas chamam mais a atenção obras pouco conhecidas, como a sensacional Acme Novelty Library 19, de Chris Ware.


Cada página de Ware parece minuciosamente planejada, entrelaçando diversos tempos narrativos sem complicar a leitura. Perfeito desde os traços limpos e estilizados até a escolha das cores. Os personagens são tão bem construídos que é impossível não compartilhar seus sofrimentos. O trecho selecionado por Gaiman dá apenas uma idéia da complexidade narrativa da HQ.


Outras obras se destacam. The Lagoon, de Lilli Carré é uma história misteriosa e sobrenatural, com bela arte em preto e branco. Gilbert Hernandez, co-criador da cultuada revista Love and Rockets, ilustra um divertido e ligeiro roteiro de ficção científica escrito por seu irmão Mario. Fatos históricos são retratados nos quadrinhos de Michael Cho – a história da criação da primeira bomba atômica – e Josh Neufeld – os efeitos do furacão Katrina.


O único super-herói que aparece no livro é o obscuro Omega The Unknown, publicado pela Marvel por um breve período durante os anos 1970, e recentemente recriado pelo escritor Jonathan Lethem com a ajuda de vários artistas. A introdução da HQ ficou excelente nos traços primitivos de Gary Panter, veterano dos quadrinhos alternativos.


Devido ao limitado espaço disponível, a coletânea apresenta apenas trechos de no máximo 30 páginas das HQs escolhidas, funcionando como um guia para despertar o interesse do leitor. Embora tenham ficado de fora desta edição autores importantes como Kaz e Jaime Hernandez, The Best American Comics continua cumprindo o papel de apresentar um panorama da produção de quadrinhos norte-americanos contemporâneos.

Autores: Vários
Editor: Neil Gaiman
Ano de Edição: 2010
Editora: Houghton Mifflin Harcourt
352 páginas

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

A perturbadora Love and Rockets New Stories n.3


Ao contrario das duas edições anteriores, o terceiro número de Love and Rockets New Stories dificilmente passará despercebido. Seja pela qualidade das HQs, seja por algumas das mais estranhas imagens de sexo e violência já vistas em uma obra dos irmãos Hernandez.

Costuma-se dizer que Jaime Hernandez é melhor desenhista que roteirista, enquanto Gilbert Hernandez cria ótimas histórias e artes apenas medianas. Mas não é bem assim.

Gilbert acertou a mão logo em 1983, no terceiro número da revista Love and Rockets original, quando começou a contar histórias ambientadas na fictícia cidade de Palomar. Muitos viram nessas histórias grande qualidade literária e semelhanças com o realismo mágico das narrativas do escritor Gabriel Garcia Marquez, e a partir de então a obra de Gilbert passou a receber merecidos elogios. O talento de Jaime levou mais tempo para aparecer. Sempre com os mesmos personagens – principalmente as garotas Hopey e Maggie – foi aos poucos abandonando a ficção científica para criar narrativas mais realistas. Em Vida Loca 2 (The Death of Speedy Ortiz), publicada na Love and Rockets 22 (1987), sua arte e narrativa já estão maduras, mas o reconhecimento da crítica só viria com Flies on the Ceiling, alguns anos depois.
Após o cancelamento da revista Love and Rockets em 1996, Gilbert mergulhou em experimentações narrativas e enredos surreais, tanto em novelas gráficas como em HQs curtas. Jaime, por sua vez, continuou desenvolvendo o universo de Hopey e Maggie, acrescentando novos personagens e dando mais complexidade e profundidade aos já existentes.

Em Love and Rockets New Stories n.3 Gilbert parece ter perdido o rumo. Violência gratuita e bizarrices sexuais indescritíveis infestam suas HQs neste volume. Gilbert havia mostrado obsessão por cenas violentas em suas recentes novelas gráficas Chance in Hell (2007) e Speak of the Devil (2008), mas nunca de forma tão gratuita, com histórias tão frouxas e vazias, ainda mais se comparadas com as três densas narrativas que Jaime apresenta no mesmo livro.

A primeira HQ de Jaime neste volume, The Love Bunglers Part One, pode parecer um pouco ingênua, mostrando o cotidiano de Maggie, mas é apenas o prólogo da tragédia que será mostrada em seguida, em Browntown.

Nas 30 paginas de Browntown Jaime consegue reunir uma variedade incrível de emoções, costuradas de modo preciso e sutil. A HQ narra um episódio da adolescência de Maggie, a partir da mudança de sua família para uma cidade pequena e monótona. O que de início parece ser um drama adolescente – Maggie se sente infeliz e solitária na nova cidade – com breves seqüências de humor protagonizadas pelos irmãos da garota, logo evolui para uma história de dissolução familiar, abuso sexual e assassinato. Jaime passa da comédia para a tragédia com naturalidade impressionante. A última HQ do livro, The Love Bunglers Part Two, faz a conexão entre as duas HQs anteriores de modo inesperado. Jaime encerra sua narrativa de modo pungente, mas habilmente evita o dramalhão. A última página da HQ é tão simples e despojada quanto angustiante, e certamente deixará o leitor com um nó na garganta.
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Nestas três HQs Jaime Hernandez mostra absoluto domínio sobre sua arte. Nos desenhos é um mestre no equilíbrio entre o branco e preto. Seus traços simples e precisos ilustram com perfeição tanto as seqüências cômicas quanto as dramáticas. Sua técnica narrativa é discreta. Jaime, que também é o autor da melancólica e belíssima arte da capa do volume, talvez tenha atingido, com Brownton, o ponto mais alto de sua carreira.


Título: Love and Rockets New Stories n.3
Autores: Gilbert Hernandez e Jaime Hernandez
Editora: Fantagraphics Books
Ano de Edição: 2010
104 páginas

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Eagle, a inovadora publicação que levou os britânicos ao espaço

Eagle foi uma revolucionária, popular e influente revista britânica voltada para crianças e adolescentes. Publicada entre os anos de 1950 e 1969, combinava histórias em quadrinhos e matérias sobre esportes e ciências. Em suas páginas nasceu o personagem de ficção científica Dan Dare, que continua na ativa em HQs escritas por autores como Grant Morisson e Garth Ennis.
O idealizador da Eagle foi o vigário anglicano Marcus Morris, que buscava um jeito inovador de transmitir os ideais da igreja aos jovens. Embora detestasse a violência dos quadrinhos de terror, Morris estava ciente de que nenhuma publicação britânica possuía a qualidade gráfica dos gibis americanos de crime, horror e guerra que tinham se tornado populares entre os jovens britânicos após a Segunda Guerra. Com a ajuda do artista Frank Hampson, desenvolveu o modelo do que seria a Eagle: Uma publicação moderna e educativa, que usaria a linguagem dos quadrinhos para transmitir valores morais de modo sutil, sem preconceitos étnicos e sem impor ideais religiosos.
A publicação foi um sucesso desde a primeira edição, que vendeu cerca de 900.000 cópias. Enquanto as publicações concorrentes mais se pareciam com livros ilustrados contendo longos e enfadonhos textos educativos, a Eagle era mais leve e direta. A arte dos quadrinhos era irretocável e as magníficas ilustrações eram modernas e coloridas. Todas as edições traziam pelo menos um cutaway – ilustração de um veículo moderno, cortada de modo que se pudessem ver as peças em seu interior.


O grande talento da Eagle foi Frank Hampson, criador e principal ilustrador do personagem Dan Dare. A arte de Hampson era extremamente detalhista, e a qualidade da colorização muito superior a dos gibis norte-americanos.


Para atingir um efeito mais realista, personagens e objetos eram desenhados a partir de modelos ou fotos. Muitas vezes a própria equipe de ilustradores posava para a criação da arte.


Os roteiros das aventuras espaciais eram ingênuos, mas havia grande preocupação com a plausibilidade científica. O escritor Arthur C. Clarke contribuiu como consultor para várias HQs.


Hampson abandou definitivamente as HQs de Dan Dare em 1959 e o personagem passou a ser desenhado por outros artistas. A última HQ de Dan Dare para a Eagle foi publicada em 1967, com arte bem inferior a dos anos 1950.
A derradeira contribuição de Hampson para a Eagle foi a HQ The Road of Courage, sobre a vida de Jesus Cristo, feita a partir de minuciosa pesquisa iconográfica.
A partir de meados da década de 1960 as vendas da publicação caíram drasticamente. Os editores tentaram acompanhar as mudanças de comportamento dos leitores, incluindo matérias sobre música pop, mas pouco adiantou. Em meio à explosão da contracultura, a publicação parecia irremediavelmente reacionária.
A última edição da Eagle saiu em Abril de 1969, poucos meses antes da chegada do homem à Lua. A Eagle serviria de modelo para incontáveis publicações em todo o mundo. Dan Dare se tornaria personagem de programas de rádio e TV, seria citado em músicas do Pink Floyd (Astronomy Domine) e David Bowie (D.J.) e serviria de inspiração para vários outros personagens de ficção científica. A arte de Dave Gibbons seria muito influenciada pelo estilo de Hampson. Dan Dare também é citado em The League of Extraordinary Gentlemen: Black Dossier, de Alan Moore.
Várias coletâneas foram lançadas reunindo material da Eagle. Em geral esses livros mais se parecem com cadernos de recortes – um amontoado de matérias, ilustrações reduzidas e HQs incompletas, com poucas informações sobre os autores. Mesmo assim certas matérias acabaram adquirindo um humor involuntário, como esta abaixo, que mostra como seriam os computadores pessoais nos anos 1990.


Algumas propagandas também se tornaram hilárias, como a deste brinquedo dos anos 1960, obviamente perigoso. Será que o Inmetro aprovaria?

sábado, 30 de outubro de 2010

O Poderoso Thor, por Tony Millionaire

Em breve deve ser lançada a coletânea Strange Tales 2, com personagens da Marvel adaptados por autores de quadrinhos alternativos. Tony Millionaire contribuirá com uma HQ de Thor. Para o primeiro volume de Strange Tales, Millionaire havia criado uma bizarra, surreal e engraçadíssima aventuara do Homem de Ferro.





domingo, 24 de outubro de 2010

Mister I


Título: Mister I
Autor: Lewis Trondheim
Editora: : Nantier Beall Minoustchine Publishing
Ano de Edição: 2007
32 páginas

Seguindo a linha do ótimo Mister O, Mister I é um hilário exercício minimalista do quadrinista francês Lewis Trondheim.
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Todas as 30 HQs do livro possuem um formato fixo: cada página apresenta uma única história, independente, composta por 60 quadrinhos. Todo o humor é visual, nenhuma palavra é utilizada. Mesmo com esses poucos recursos o autor consegue esboçar uma simpática personalidade para seu personagem principal.


 Mister I é um sujeito atrapalhado e sem dinheiro, que está sempre tentando roubar comida. Morre no final de quase todas as histórias.
Trondheim usa muito bem a repetição narrativa como elemento humorístico. A escatologia e violência também são usadas de modo engraçadíssimo.


sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Ilustração: Samuel Rosa (Skank)


Pra revista MONET. Colagem com papel. Detalhes do rosto com caneta hidrocor.

DC Comics republica as últimas HQs do Spirit de Will Eisner


Autores: Will Eisner, Jules Feiffer

Editora: DC Comics

Ano de Edição: 2009

256 páginas

The Spirit Archives é uma série de coletâneas lançadas pela DC Comics que apresentam, em ordem cronológica, as HQs do famoso herói criado por Will Eisner em 1940.

O Volume 26 da série traz as poucas HQs do Spirit feitas por Eisner após o cancelamento da Spirit Section, o caderno de quadrinhos onde suas aventuras foram publicadas semanalmente até 5 de Outubro de 1952. No início dos anos 1950, Eisner já havia deixado praticamente todo o processo de criação dos quadrinhos do personagem nas mãos de seus assistentes.

A primeira HQ da coletânea é apenas um esboço de uma história que deveria ser publicada em 12 de Outubro de 1952, mas nunca foi terminada. Com texto e arte de Jules Feiffer, Flying Saucer (Outer Space), que também aparece no livro Quadrinhos e Arte Seqüencial, é divertida e mostra a competência de Feiffer, mas não está entre suas melhores obras.

Spirit só voltaria a ter uma nova HQ publicada em 1966, no periódico The New York Herald Tribune Sunday Magazine. Com roteiro e arte de Eisner, a HQ mostra Spirit contracenando com personagens reais- os candidatos de 1965 a prefeito de Nova Iorque.

O primeiro gibi a republicar os antigos quadrinhos do Spirit, foi lançado pela Harvey Comics em Outubro de 1966 e teve apenas duas edições. Para cada uma dessas edições, Eisner criou uma nova aventura de seu herói, mas nada muito memorável.

Em 1973 houve outra tentativa de republicar as clássicas aventuras do Spirit, agora pela editora Kitchen Sink Enterprises. Novamente foram apenas duas edições, para as quais Eisner concebeu algumas novas páginas de HQ sem muita relevância. Bem mais interessantes foram as capas criadas pelo artista, uma delas bem picante.


Após uma breve passagem pela editora Warren, The Spirit voltaria em 1977 para a Kitchen Sink, que relançaria, em ordem cronológica, todas as HQs do herói originalmente publicadas entre 1946 e 1952.
Nos anos 1980, seria publicada The Spirit Jam, uma HQ feita com a contribuição de cinqüenta artistas, entre os quais Milton Caniff, Harvey Kurtzman, Frank Miller, Bill Sienkiewiwicz e o próprio Will Eisner. Por mais incrível que pareça, das 36 páginas da HQ, apenas as três desenhadas por Eisner estão presentes na coletânea da DC, deixando uma lastimável lacuna.

Em 1984, Spirit apareceria em um gibi do personagem Cerebus, criado por Dave Sim. Nessa história, Eisner não participou do roteiro. Apenas desenhou seus personagens em algumas páginas.

Eisner só voltaria a fazer uma HQ do Spirit no século XXI - uma história cômica, publicada em 2005, no sexto número do gibi The Amazing Adventures of Kavalier & Clay. Spirit contracena com o Escapista, e em um diálogo breve, mas revelador, o papel dos heróis na sociedade é reduzido a “soluções instantâneas e finais felizes”. Obviamente Eisner há muito perdera o interesse por histórias de heróis. Desde a década de 1950 preferiu explorar as possibilidades dos quadrinhos educacionais, e, posteriormente, das novelas gráficas.


Por abranger um período em que Eisner já não mais se interessava por seu grande herói, The Spirit Archives Volume 26 decepciona como coletânea de quadrinhos. O trunfo do livro é reunir uma quantidade enorme de artes criadas por Eisner para as capas das reedições dos gibis do Spirit, além de reproduzir as pinturas e esboços feitos para The Spirit Portfólio, uma coleção rara, originalmente lançada nos anos 1970. Mas nem a ótima arte de Eisner justifica o preço do livro: US$59,99. Para que se tenha uma idéia do tamanho da facada, Strange Suspense – The Steve Ditko Archives, publicado pela Fantagraphics Books, com aproximadamente as mesmas dimensões e número de páginas, custa US$39,99.


segunda-feira, 4 de outubro de 2010

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Ghost World, HQ clássica de Daniel Clowes, continua inédita no Brasil


Entre os autores que faziam quadrinhos underground nos anos 1980, Daniel Clowes foi um dos que mais se destacou. Nunca se acomodou, continuou aprimorando sua técnica narrativa e criou um conjunto de novelas gráficas de altíssima qualidade, sem pontos baixos. Ao lado de Charles Burns e Chris Ware, está entre os melhores quadrinistas contemporâneos. Mesmo assim, teve apenas uma novela gráfica, Como Uma Luva de Veludo Moldada em Ferro, publicada no Brasil.

A evolução de seu trabalho ficou evidente no decorrer da publicação de suas revistas de quadrinhos Lloyd Llewellyn e Eightball. O humor bizarro das primeiras HQs foi aos poucos substituído por uma visão pessimista, melancólica do mundo. Como Uma Luva de Veludo Moldada em Ferro, publicada na Eightball entre 1989 e 1993 foi a obra de transição, com uma trama absurda e surreal, humor negro e violência extrema.

Entre 1993 e 1997, também na Eightball, foi publicada, em capítulos, a HQ Ghost World, que seria lançada no formato de novela gráfica em 1997, atingiria um público amplo e tornaria Clowes conhecido fora do circuito underground. Uma crítica publicda na revista Time declarava que Ghost World era um clássico instantâneo. Outros críticos chegaram a comparar a obra ao livro O Apanhador no Campo de Centeio, de J. D. Salinger, pela autenticidade com que mostrava as angústias da adolescência. Em 2001 foi lançado um filme baseado na HQ.

As personagens principais de Ghost World são a inquieta e impulsiva Enid, e sua amiga inseparável e cúmplice Rebecca. As duas adolescentes, recém formadas no colegial, parecem não ter objetivos nem ocupações, além de criticar tudo e todos que encontram pela frente.

Enid, com seu humor amargo, parece refletir a personalidade de Clowes. Age como a líder da dupla, arrastando Rebecca para lugares bizarros e discursando sobre qualquer coisa que lhe passe pela cabeça. Rebecca, apesar de seguir passivamente Enid, é uma personagem mais comum, uma adolescente sem grandes ambições, que não sabe bem o que fazer da vida.


As duas meninas perambulam pelos subúrbios de uma cidade americana típica, com sua infinidade de centros comerciais e casas de classe média, e seus estranhos habitantes, como um neonazista, possíveis satanistas e um ex-padre pedófilo. Ghost World é a frase que aparece pichada em vários pontos da cidade, e descreve esse mundo onde se é solitário vivendo entre milhares de pessoas, uma América onde tudo parece bizarro e ridiculamente falso, como um restaurante que tenta vulgarmente imitar o estilo dos anos 1950 em plenos anos 1990.

Enid e Rebecca andam em círculos nesse mundo fantasma, protegidas pela sensação, típica da adolescência, de ser algo puro em meio a uma sociedade corrompida. Mas logo chega o momento em que é preciso amadurecer, decidir seu destino: pular fora ou se acomodar ao mundo fantasma. Cada garota toma um rumo, e a separação carrega a HQ de emoção. O final é aberto, misterioso e tocante, mas sem exageros.

A arte de Clowes combina perfeitamente com seus personagens estranhos e a arquitetura kitsch das cidades em que eles habitam. Uma pálida luz verde-azulada banha todos os quadros, segundo Clowes para passar a sensação de que o mundo fantasma da HQ é iluminado apenas pelo brilho artificial dos aparelhos de TV.

Desde 1997, Ghost World foi publicada pela Fantagraphics em vários tipos de encadernados. A mais econômica é a edição em capa mole, mas os fanáticos pelo trabalho de Clowes também podem adquirir a edição especial de luxo lançada em 2008, com capa dura, esboços dos personagens, alguns comentários do autor e o roteiro do filme baseado na HQ.

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Ilustração: Luana Piovani


Caneta hidrocor e colagem com vários tipos de papel. Achei que seria fácil fazer uma caricatura da Luana Piovani, porque ela tem características marcantes como olhos verdes e muitas sardas. Ironicamente, acabei não fazendo nem olhos nem sardas. Achei que ficou melhor assim.

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Eles estão chegando! Dinosaur Jr- discografia básica


Quando um tiozinho de longos cabelos brancos subir ao palco do Comitê Club, em São Paulo, e apoiar uma guitarra sobre sua barriga saliente, não ria. Trata-se de J. Mascis, vocalista e guitarrista do Dinosaur Jr, uma lenda do rock alternativo, o cara que gravou algumas das canções mais barulhentas dos anos 80, foi reverenciado por bandas grunge e shoegazer e recusou ter um disco produzido por David Bowie. O Dinosaur Jr vem tocar no Brasil com sua formação original, que além de Mascis traz Lou Barlow no baixo e vocais, e Murph na bateria.


You´re Living All Over Me -1987

Depois de um primeiro disco confuso e pouco memorável, o Dinosaur Jr lançou este álbum, que muitos consideram sua obra-prima. Logo na primeira música, Little Fury Things, a banda mostra o que a tornava especial: uma introdução barulhenta seguida de uma passagem calma e melodiosa, sobre a qual Mascis canta preguiçosamente. No final entra uma guitarra tão distorcida que soa como uma serra elétrica, e a canção termina com alfinetadas de microfonia. As mudanças de velocidade, e a alternância entre passagens calmas e barulhentas, na mesma canção, se tornariam marcas registradas do Dinosaur Jr, antes de serem popularizadas por bandas como Pixies, Nirvana e tantas outras.
Em The Lung e In a Jar, a banda mostra seu lado punk mais melódico, quase pop. Lose, composta por Lou Barlow, segue na mesma linha, lembrando um pouco Husker Du, com solos descontrolados e abrasivos. No meio da acelerada Kracked explode um furioso solo de guitarra que parece saído diretamente do primeiro disco dos Stooges. Raisans antecipa a sonoridade que o Sonic Youth apresentaria em Daydream Nation e Goo. Poledo é a única canção acústica do disco. Também é a mais estranha e experimental.  Composta por Lou Barlow, que canta e toca ukulele. Cheia de efeitos eletrônicos e mudanças de andamento, lembra Sebadoh, a banda que Barlow formaria após sair do Dinosaur Jr.


Bug – 1988

A banda abandona as experimentações e busca o equilíbrio entre melodia e barulho. As músicas parecem mais tradicionais e fica mais clara a influência do rock clássico de conjuntos dos anos 60 e 70, como Stones, Creedence e Buffalo Springfield.
Freak Scene é o destaque do disco, com sua melodia empolgante, o som das guitarras mudando de cristalino para barulhento com incrível naturalidade e perfeição e os solos de guitarra irretocáveis de Mascis.
Freak Scene tornou-se um hit nas rádios alternativas britânicas e Bug atingiu o primeiro lugar na lista britânica de discos independentes mais vendidos. Apesar do sucesso comercial, a tensão que existia entre os membros da banda aumentou. Mascis era tão controlador que além de produzir o disco e compor todas as canções, definiu exatamente como Murph deveria tocar a bateria.
Mascis só não canta em Don´t, que remete ao primeiro disco, com um turbilhão de guitarras barulhentas a la Stooges, baixo distorcido e os vocais berrados de Lou Barlou.


Green Mind – 1991

Durante a turnê de Bug, em 89, Mascis toma o controle total da banda e expulsa Lou Barlow. O baixista passaria a se dedicar a seus projetos paralelos, como o Sebadoh, que com o tempo se tornaria uma das mais cultuadas bandas da cena alternativa norte-americana.
Praticamente um trabalho solo de Mascis, Green Mind foi gravado quase inteiramente com músicos convidados. Murph, o baterista original do Dinosaur Jr toca em apenas três músicas. Mascis novamente produz o disco e compõe todas as canções.
É o disco mais acessível da banda, com uma sonoridade quase folk rock. O som das guitarras está mais baixo e menos distorcido. Violões são audíveis em quase todas as faixas. O clima geral é bem mais calmo que o dos discos anteriores. Apenas How´d You Pin That One On Me tem um espírito mais punk.
Até 1997 Mascis gravou mais três discos usando o nome Dinosaur Jr, sem a participação de nenhum outro membro original da banda. A partir de 1999 passaria a lançar discos sob o nome J Mascis and the Fog.


Farm – 2009

A formação original da banda voltou a se reunir em 2005 para uma série de shows. Em 2007 gravaram o disco Beyound, bem recebido pela crítica, mas foi com este Farm que o Dinosaur Jr voltou com força total. A fúria das músicas dos anos 80 ficou para trás, mas a banda consegue manter o equilíbrio entre as guitarras pesadas e canções pop, rock alternativo e tradicional, que havia em Bug.
Friends lembra o punk melódico que o Replacements fazia nos anos 80. See You é o tipo de pop rock agridoce que o Lemonheads adoraria ter composto. Lou Barlow volta a compor e cantar em duas músicas que fariam bonito em qualquer disco do Sebadoh, e dão certa variedade sonora ao álbum.
O que era ousado nos anos 80, hoje pode soar ultrapassado. Mas não se deixe enganar; ao vivo, o tiozinho Mascis costuma aumentar o volume da guitarra e fazer uma barulheira dos diabos.

Além dos shows em São Paulo, no Comitê Club, dias 28 e 29 de Setembro, a banda também tocará em Recife, dia 25, no festival No Ar Coquetel Molotov.